quarta-feira, 26 de junho de 2019

Nota sobre o projeto de criação do livro O desvio das gentes

O livro não existe ainda; ele está a ser preparado. O desvio das gentes, no momento em que escrevo esta nota, é um projeto de criação de um livro de poesia, apoiado pela Prefeitura da Cidade de São Paulo, que deve ser concluído em 2019.
Na tradição poética brasileira, podem ser encontradas algumas notáveis obras com preocupação cosmopolita. O Guesa, de Sousândrade, fez com que Wall Street e o sistema internacional do capitalismo entrassem na poesia nacional por meio de uma poética inovadora, muito à frente de seu tempo. Sentimento do mundo, de Carlos Drummond de Andrade, e As metamorfoses, de Murilo Mendes, apenas para citar mais dois exemplos, também unem a experimentação formal com a investigação literária do mundo.
O projeto de O desvio das gentes, mais modestamente, buscava, a princípio, inserir-se nessa linha da poesia brasileira e com ela dialogar, privilegiando a polifonia com a presença de diversas vozes que irrompem no poema para instaurar divergências e diferentes visões de mundo.
A temática do cosmopolitismo, que abrange tanto a criação de espaços de ação na esfera internacional quanto a problemática dos direitos humanos, individuais e coletivos, possui relevância para as poéticas de hoje. É de notar que o título dialoga com a antiga expressão "direito das gentes", que tem origem no Império Romano (ius gentium) para se referir aos direitos dos diferentes povos que integravam aquele Império, e ainda é empregada nos dias de hoje para designar o que hoje geralmente se denomina de direito internacional público.
No entanto, escolhi tratar de algumas dessas questões pelo prisma do desvio, e não do que é "direito". Em primeiro lugar, por ter escolhido a poesia, que privilegia esses olhares oblíquos sobre a realidade. Para olhares direitos e diretos, temos a prosa. 
Se o olhar é um olhar diverso, os temas escolhidos também se marcam pelo desvio, como os refugiados e os clandestinos, em relação aos cidadãos e ao Estados.
Em um terceiro plano, o desvio das gentes acaba por redundar em um afastamento do humano: bactérias e vírus estão entre os personagens do livro, entre catástrofes climáticas e devastação ambiental.
No Código negro, livro de 2013, com seus cachorros, nos Cinco lugares da fúria, de 2008, com mosquitos e cupins, no Cálcio (2012) eu já tinha efetuado alguns desvios em relação ao humano. Pretendo fazê-lo novamente, desta vez com a marca da catástrofe.

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