quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Sobre o "capitalismo humanista das bombas": trecho da apresentação de Taís Franciscon

O desvio das gentes será lançado em São Paulo no dia 24 de outubro de 2019 na Biblioteca Municipal Álvaro Guerra, na Avenida Pedroso de Moraes, 1919, no bairro de Pinheiros. Ruy Proença lançará Monstruário de fomes na mesma ocasião, em que falaremos sobre esses trabalhos.



Tendo em vista que "capitalismo humanista" virou até linha de pesquisa em certos programas de pós-graduação, e por isso ele acabou sendo referido na obra, resolvi destacar este trecho da apresentação do livro, escrita por Taís Franciscon:
A democracia está numa ala separada: apinhada de pessoas que querem, finalmente, descobrir o que ela é; mas só há o modelo aprovado previamente por investidores. O museu do pó traz um conceito inovador: quanto mais resíduos tóxicos, mais avançada é a civilização. O museu dedicado à atmosfera provoca a asfixia; está repleto de retratos de genocidas que ganharam o Nobel da Paz.
Em meio à topografia negativa, o Livre Mercado, maiúsculas como um deus, vive a apoteose. Por um lado, realiza ações que não são tão distantes da realidade: defende o direito empresarial do agrotóxico; comercializa, online, atentados à dignidade humana, apenas porque são lucrativos; inclui nos decretos petrolíferos a compra de acidentes atômicos. Vale observar que é justamente o Livre Mercado quem motiva o “capitalismo humanista das bombas”: afinal, quem anuncia a cotação na Bolsa de Valores são homens-bomba. No último estágio, há bombas em paraísos fiscais, enquanto “a bomba financia / os planos globais de investimento / no mercado da catástrofe”.
Ao se falar desse capitalismo explosivo, entra em cena outro agente da perpetuação da barbárie: o Estado, cujos fiéis servidores são as jaulas. Dependente das fraturas dos ossos e das lágrimas, o Estado transmuta os direitos humanos para as barras de ferro e, diante da tragédia, surrupia a democracia, que lhe começa a parecer incômoda. Em nome dele, memórias de massacres são sufocadas. O apagamento de registros de atrocidades é tarefa conhecida pelo autor. Desarquivar o Brasil está na trajetória poética e jurídica de Pádua Fernandes; ele foi um dos pesquisadores da Comissão da Verdade do Estado e da Prefeitura de São Paulo.
Apesar de O Desvio das Gentes reverberar, inevitavelmente, os traços do horror brasileiro, fica claro que o panorama devastador pertence a uma geografia ampla, onde os “horizontes são alargados até o napalm”.

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